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22.9.04

O Pai dos Pobres no Orfanato

Lendo um artigo sobre a proposta, feita por Marcus Garvey, de uma emigração de afro-americanos para o Brasil, tido à época como "paraíso racial," e as reações no lado de cá. Soa até familiar:

Um deputado pernambucano propôs a criação de uma lei que controlasse a entrada de negros no país. (Controlar quer dizer barrar mesmo.)

As reações na própria Câmara não foram lá muito receptivas :

"O projeto é um atentado aos direitos do homem e do cidadão...é um atentado à dignidade da raça negra...O Brasil , pelos seus representantes, só pode repelir esse infeliz projeto, que seria o indício de um Código Negro, de uma política de preconceitos de raça indigna de uma República." (Deputado gaúcho positivista)

"verdadeiramente horrorizado...não compreender como o Sr. Andrade Bezerra...havia esquecido, ao redigir seu projeto proibindo a entrada de negros no Brasil, não apenas os mais belos artigos de nossa constituição federal, mas principalmente sua fé cristã" (Deputado pernambucano católico)

etc etc etc

Já boa parte da imprensa da Capital era a favor - "não que fosse racista," claro. Com umas poucas exceções, de um racismo hilário de tão histérico, e algumas outras exceções contra o projeto.

No final das contas? O projeto gorou, mas o Governo encarregou-se de criar dificuldades à imigração vinda dos EUA, extra-oficialmente. Quem iria instaurar o racismo e a eugenia na forma da lei? Ele mesmo, o titio Getúlio, rolha do poço agora cavado lá na Glória.

Outra coisa interessante do artigo é a parte do discurso do deputado gaúcho em que ele menciona que a Constituição permitia o livre trânsito inclusive sem passaporte. Vê se hoje em dia atravessar fronteira sem passaporte ia ser permitido. Os fascistas perderam a batalha mas ganharam a guerra. :/

Ns.E. -

Marcus Garvey - Líder negro jamaicano-americano. Doidão - é como se ele fosse uma mistura fin-de-siècle de Malcom X com Afrika Bambaata. Racismos à parte, o artigo na Estudos Afro-Asiáticos deixa de lado o fato de que a intenção dele era mesmo criar um estado nacional negro, no Mato Grosso ou na África. O site da TVE americana sobre ele : http://www.pbs.org/wgbh/amex/garvey/

Código Negro - Code Noir - Código regendo as relações raciais no Império colonial francês, editado pela primeira vez por Luís XIV. O racionalismo e clareza envolvidos fizeram dele um ícone da dureza em se tratando de racismo no século XIX, em que a referência ao Haiti de Toussaint L'Ouverture ainda era mais importante no discurso contra o racismo do que a historiomitologia da luta contra o racismo nos EUA. As prescrições dele não eram, apesar disso significativamente piores do que o tratamento dado aos escravos em outros lugares. (Quer dizer, eram horríveis.)
http://www.tlfq.ulaval.ca/axl/amsudant/guyanefr1685.htm
http://www.historia.presse.fr/data/thematique/80/08003401.html

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