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3.1.12

Yes we have no xenophobias

O Globo anuncia que o Acre sofre com invasão de imigrantes haitianos. À primeira vista, pode-se encarar isso apenas como sinal de que o Brasil, com crescimento econômico maior do que outras economias médio pra ricas, está se juntando novamente ao clube dos atratores de imigrantes, com a consequente xenofobia. O título dO Globo não ficaria mal num Daily Mail, numa FOX News da vida. Mas a leitura do subtítulo (sequer da matéria) revela que "Sobe para 1.400 o número de haitianos em Brasileia. Maioria é de profissionais qualificados." Vamos lá. Acre sofre com invasão de 1400 pessoas, a maioria profissionais qualificados. (O estado, para situar, tem 730.000 habitantes.)

Lendo a matéria propriamente dita, descobre-se que há, com efeito, uma mini-crise humanitária, em que os imigrantes, importados por coiotes (traficantes de gente) mexicanos, foram despejados todos sem ter o que fazer nem como comer em um único município acreano, e não podem fazer nada porque a burocracia da PF não deixa. O título poderia ser, mais realisticamente, "imigrantes ilegais haitianos sofrem com burocracia." (Olha aí, para fazer um agradinho à direita até enfiei o "ilegais" no meio.) O título não é o único nessa linha, nem dO Globo nem do resto da mídia. E assim põe-se em questão o pretenso Brasil, não apenas cordial, mas xenômano.

O Brasil é xenômano, naquelas, pelos cidadãos de países do "primeiro mundo," superiores na escala social. Num país obcecado por status, a simples associação, ainda que distante, com um superior é buscada como medalha de honra (vide a importância das viajens ao exterior no imaginário e discurso dativo da classe média, descrita por Gilberto Velho em Anjos e Heróis). Quando some essa necessidade do status por associação, o país é aquele que consegue ter skinheads atacando imigrantes sem ter imigração expressiva de estrangeiros, com imigrantes do próprio país mesmo.

Por sorte, a população como um todo, ou o governo, não praticam esse preconceito exatamente da mesma forma que os círculos da imprensa e da classe média; no Haiti, a preocupação principal das autoridades parece ser mesmo a da crise humanitária, e ainda não vi muita gente fazendo campanha política em cima da necessidade de se erguer uma cerca na fronteira com a Bolívia. O que assusta é que nossa imprensa já se traveste de Daily Mail com uma imigração minúscula de gente de classe média. Imagina se o país ficar rico e, como os países ricos, começar a atrair imigrantes em escala expressiva, e parte deles mais pobres? (Sem nem tocar na questão do racismo, já que Ali Kamel nos informa que por cá ele não existe.)

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