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24.4.12

A tale of two Marinas Tião Cacareco

Muita gente tem comparado a atitude do candidato à presidência francesa Jean-Luc Mélenchon com a atitude da candidata à presidência brasileira Marina Silva. Sendo os dois candidatos representantes (a princípio) da esquerda, um conclamou para o segundo turno votos contra a direita, sem em momento algum falar bem do Partido Socialista, a outra manteve-se neutra. Mélenchon, crê-se, terá mais relevância na política francesa nos próximos anos do que Marina Silva, cuja maior realização ultimamente foi sagrar-se pastora. E olha que obteve bem menos votos no primeiro turno (ok, por outro lado todo mundo na eleição francesa obteve menos votos do que na Brasileira).

A comparação é completamente descabida. O verdadeiro equivalente de Mélenchon, num país muito mais à direita do que a França, é Plínio de Arruda Sampaio. Marina Silva, em termos de programa político, estava mais pra François Bayrou, com seu ambientalismo não muito convincente (não falava nada sobre as hidrelétricas na Amazônia) contraposto a um liberalismo econômico igualmente vago. Era uma centrista. Mas apenas parte de seu eleitorado votava nela por isso; votavam, isso sim, "contra isso tudo que está aí," contra a política. O eleitorado da Marina Silva é o leitor apaixonado da Veja, que assiste CQC. (Por mais que tanto Veja quanto CQC votem nos Democratas.)

E a mesma coisa pode ser dita de Marine Le Pen. Há os fascistas, evidentemente, que fazem desfile em honra a Joana D'Arc no primeiro de maio e sopa identitária, mas também há muita gente que vota na FN apenas como forma de mandar um dedo do meio em riste para a política. É a versão das urnas da Siouxsie com uma braçadeira de suástica no braço.

A observação é, sem dúvida, pouco elogiosa para MarinA. Mas ela é péssima mesmo para o anão demônio Sarkozy. Porque significa que boa parte dos eleitores de Le Pen não são em absoluto atraídos pela sua guinada à direita, e pelo contrário, podem até ser repelidos por ela. Enquanto isso, uma proporção razoável dos eleitores de Mélenchon pode votar contra Sarkozy (como o fizeram vários eleitores do Plínio, com menos peso total). E a mesma guinada à direita aliena a maioria dos eleitores de Bayrou, e até alguns dos que votaram no próprio Sarkozy. Vários cardeais da UMP já perceberam isso, e reclamam da direção tomada pelo partido - mas o Smurfíssimo é turrão.

PS Se a última pesquisa de opinião estiver certa, eu tô errado. Pra mim o curioso sempre será como um francês xenófobo pode apesar disso votar num filho de húngaro casado com uma italiana; não imagino um japonês, alemão ou sueco xenófobos fazendo isso. (Tem família "coreana" no Japão que tá lá desde o período Edo.) E não é só porque ele é branquelo - na França tem bastante preconceito baratinho pra oferecer ao povo da Europa Oriental.

5 comentários:

Adib disse...

Eu trocaria "leitor apaixonado de Veja" por "leitor desavisado de Veja". O apaixonado votou no Serra. Talvez o leitor apaixonado da "vejinha" tenha votado na Marina. Eleitor da Marina não é vejista o suficiente.

raph disse...

Eu apoiei a Marina e não sou leitor de Veja, e nem acho o CQC mais tão engraçado assim (mas no primeiro ano era bom).

Hoje eu, sabendo do que a Dilma fez, até preferiria a Dilma a Marina mesmo. Mas na época da eleição, com aquele "debate político" de PT vs PSDB (que aliás não mudou muito), votar na Marina era a única opção aparente.

O problema do PT é achar que "está bom se for melhor que o PSDB"... Não está, o PSDB foi muito ruim e o PT, razoável, mas poderia ter sido muito, muito melhor, se tivesse outros parâmetros de comparação.

thuin disse...

Bem, eu disse "parte." Mas você, apesar de não ser o estereótipo caricatural (até por ser inteligente, e não idiota), também votou "contra PT e PSDB," e não no programa (recrudescimento do neoliberalismo com tintas verdes) da Marina Silva. O que quero destacar é essa característica em comum das duas candidatas: o voto nelas é primeiro um voto de protesto, uma versão mais séria do voto no Macaco Tião ou no Rinoceronte Cacareco, não um voto verde ou de extrema direita. No caso da Marina, inclusive, havia outros além desses dois, tinha o voto evangélico e tinha o voto Jânio Quadros. (Em que a ética é percebida como pauta prioritária.)

Quanto ao problema do PT, eu diria que não é um, são muitos. Não é por gosto de repetição que a hashtag que tenho mais usado no twitter é #dilmadevolvemeuvoto. Até algumas das antigas virtudes do PT, como a democracia interna, têm erodido muito. E a Dilma e a curriola fã de Magnitogorsk e do Bolshoi dela são a pior parte do PT, depois do grupo do Palocci.

thuin disse...

(E só porque pelo visto não ficou claro: eu acho ambos os votos, sim, mesmo o na Le Pen, inteiramente legítimos. Guy Fawkes, temer o povo, etc.)

raph disse...

Pois é, eu hoje acho que apesar de tudo o governo da Marina seria pior do que o da Dilma, talvez bem pior.. Mas pelo menos assim teríamos, quem sabe, um debate político mais interessante na próxima eleição presidencial. Eu tenho medo é dessa polaridade PT vs PSDB que acaba não acrescentando nada e, as vezes tanto pior, faz com que o PT se "acomode" em ser apenas melhor do que o PSDB (o que não é lá muita coisa).

Abs
raph